Governo segura ‘na marra’ o preço dos combustíveis no Brasil
Os preços no Brasil estão mais baixos do que no mercado internacional. A defasagem é de 13% na gasolina e de 22% no diesel
A valorização do dólar e o aumento do preço do petróleo têm feito subir a pressão por um aumento dos preços dos combustíveis para os consumidores. Na prática, os preços no Brasil estão mais baixos do que no mercado internacional. Atualmente, a defasagem é de 13% na gasolina e 22% no diesel, segundo a Associação Brasileira de Importadores de Combustíveis (Abicom).
Mesmo que a Petrobras não repasse o aumento, os preços devem subir no mês que vem, devido ao aumento da alíquota do ICMS no Brasil. A gasolina e o etanol terão a cobrança de imposto de 10 centavos a mais, passando do atual 1,3721 real para 1,47 real por litro, um acréscimo de 7,14%. Para o diesel e o biodiesel, a alíquota de ICMS vai aumentar de 1,0635 real para 1,12 real por litro, um aumento de 5,31%.
Essas mudanças irão pressionar ainda mais a inflação, com a gasolina já sendo um dos maiores responsáveis pela alta do IPCA. O principal índice que mede a inflação registrou alta de 4,83% no ano passado.
A pressão dos combustíveis na inflação é um dos motivos pelos quais os governos adotam políticas de controle nos preços. Desde os anos 1990, o Brasil alterna entre políticas de controle e liberalização dos preços dos combustíveis. Até os anos 1990, o governo brasileiro controlava os preços, as margens de comercialização e os fretes dos combustíveis. A liberalização começou gradualmente e foi consolidada pela Lei do Petróleo (nº 9.478/1997), que criou a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).
Essa foi a lei que determinou a transição para um mercado de livre concorrência, concluída em 31 de dezembro de 2001, quando os preços passaram a ser definidos pelos agentes econômicos. Dessa forma, em 2002, entrou em vigor o regime de liberdade de preços no mercado de combustíveis. Confira como os governos agiram em relação aos preços dos combustíveis desde a década 1990 e quando presidentes seguraram o preço na marra:
Fernando Henrique Cardoso (1995-2002)
O governo de Fernando Henrique Cardoso foi responsável por iniciar o processo de liberalização do mercado de combustíveis. A Lei do Petróleo (nº 9.478/1997) foi um marco dessa transição, que culminou, em 2002, na implementação do regime de liberdade de preços. No entanto, diante de aumentos significativos nos preços, o presidente FHC determinou a intervenção no mercado, estabelecendo preços máximos para o gás de cozinha, como medida para conter a inflação e aliviar os consumidores. Embora tenha adotado intervenções pontuais, esse período consolidou a transição para um mercado de livre concorrência.
Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010)
Durante os dois mandatos de Luiz Inácio Lula da Silva, o governo adotou medidas mais incisivas de controle dos preços dos combustíveis. Um exemplo disso foi entre 2005 e 2008, quando a gasolina ficou sem aumentos nas refinarias por 31 meses consecutivos. Ao longo dos oito anos do seu governo, o preço médio do litro da gasolina aumentou apenas 43 centavos de real, apesar da alta do barril de petróleo no mercado internacional. No início do primeiro mandato de Lula, em janeiro de 2003, o preço médio do litro da gasolina no Brasil era de 2,16 reais. Ao final de seu segundo mandato, em dezembro de 2010, o valor era de 2,59 reais, o que afetou os resultados da estatal. O aumento foi anunciado em 2008 e veio acompanhado de uma redução dos tributos federais sobre combustíveis, para tentar amenizar o impacto no preço na bomba — o que gerou perda de arrecadação ao governo federal.
Dilma Rousseff (2011-2016)
No governo Dilma Rousseff, a interferência no mercado de combustíveis foi intensificada. O controle de preços foi utilizado como uma ferramenta para tentar conter a inflação. Em 2014, o reajuste de combustíveis e da energia elétrica foi represado, e, em 2015, o preço do diesel foi congelado por seis meses, como forma de atender às demandas dos caminhoneiros e conter a pressão inflacionária. No entanto, essa medida não se sustentou por muito tempo e resultou em prejuízos bilionários para a Petrobras, além de contribuir para uma inflação de 10,67% em 2015, um dos maiores índices da história recente do Brasil. O litro da gasolina comum atingiu seu pico em março de 2016, custando 3,73 reais, em média, segundo levantamento da ANP (Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis)
Michel Temer (2016-2018)
Com Michel Temer, a política de preços dos combustíveis passou a ser orientada pela paridade de preços de importação (PPI), alinhando os preços ao mercado internacional. A Petrobras passou a adotar uma política de preços que considerava não apenas o preço do petróleo, mas também custos internos de produção e transporte, o que tornava os reajustes mais previsíveis. No entanto, durante a greve dos caminhoneiros em 2018, o governo interveio para reduzir o preço do diesel em 46 centavos de real por litro, cortando tributos como PIS/Cofins e Cide.
Jair Bolsonaro (2019-2022)
O governo de Jair Bolsonaro manteve a questão do controle dos preços dos combustíveis na agenda, com algumas intervenções pontuais. Em 2019, o presidente anulou um aumento de 5,7% no preço do diesel, atendendo a pressões do setor. Em 2021, Bolsonaro também zerou os tributos federais sobre o diesel por dois meses, para aliviar os custos para caminhoneiros e consumidores. Durante seu governo, a Petrobras passou por mudanças na liderança, com a troca de Roberto Castello Branco por Joaquim Silva e Luna, como forma de adaptar a política de preços às necessidades do mercado interno, gerando um ambiente de instabilidade no setor.
Luiz Inácio Lula da Silva (2023-presente)
Em seu terceiro mandato, Lula retomou medidas de intervenção no mercado de combustíveis. Em 2023, o governo prorrogou a desoneração de impostos federais sobre combustíveis, o que teve um custo fiscal significativo, estimado em 25 bilhões de reais. Além disso, a Petrobras anunciou em maio de 2023 uma mudança na política de preços, abandonando a paridade de preços de importação (PPI) e adotando uma abordagem mais focada nos custos internos de produção e refino. Isso resultou em uma redução nos preços de gasolina, diesel e gás de cozinha.
Em maio de 2024, houve a troca da liderança na Petrobras, com a demissão de Jean Paul Prates, substituído por Magda Chambriard, atual presidente da estatal. A demissão de Prates foi encarada como uma resposta à decisão da Petrobras de aumentar substancialmente os dividendos aos acionistas, o que gerou intensos debates. Nos anos de 2022 e 2023, a empresa foi a maior pagadora de dividendos do mundo, com um total de 57,6 bilhões de dólares. Em 2024, o preço médio da gasolina ainda ficou entre os mais altos da última década. Segundo informações da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), a preço médio da gasolina passou de 5,58 reais na última semana de 2023 para 6,15 reais na última semana de 2024.
Fonte: Camila Pati em Veja